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O ANEL

Equipe Flávia Rita

Ele era loiro, alto, tinha olhos claros e sobrenome alemão – desses que a pronúncia por si só é prazerosa. Vinha de uma família bem situada do ponto de vista financeiro. Tinha dois irmãos por parte de pai e era o único filho de sua mãe. Sua mãe era uma pessoa tão especial que merecia um texto à parte. Também loira, de beleza angelical. Falava baixo. Era gentil com as pessoas sem fazer esforço. Embalava o filho único nos braços com ternura sem igual. Velava o soninho de seu anjinho.

Num desses dias de chuva, que anunciam a tristeza e profetizam as dores que guardaremos para sempre, ela adoeceu e partiu. Partiu também o coração dos que ficaram. Tão boa. Tão jovem. Mas o mover da vida conduziu para aquele desfecho, e nada realmente podia ser feito, exceto aconchegar no peito a saudade.

Além de muitos bons exemplos, deixou para o filho o único anel de sua vida. O anel que marcou a união entre ela e o pai do menininho de rosto rosado e cabelos cor de areia. O anel que tinha muitas outras histórias – todas de amor e comprometimento. Havia sido também da mãe de sua mãe. Então, de mãe para filha, de filha, agora mãe, para o filho do homem que ela amava.

Nenhum objeto representava valor sentimental mais genuíno que aquele. Tinha cravado em cada brilhante a história de suas gerações e trazia a leveza dos gestos maternos. Era realmente feminino, delicado, valioso, verdadeiro. Na ocasião, entendeu o silêncio de sua mãe ao lhe entregar o anel. Pensou em recusá-lo, enganando-se, talvez, com o fato de que aquela atitude poderia adiar a sua morte. Fez um gesto inocente de repulsa. Em tons suaves como notas de violino, ela explicou que precisava partir e se despediu.

Ele tinha desfrutado vinte anos de seu maior amor. Vinte anos e alguns meses. Nada além disso. Tentando segurar o choro humano que se fazia justo e necessário, pegou o anel e o beijou docemente. A mãe, no leito de morte, balbuciou algo antes de morrer como “encontre a sua princesa e lhe dê o anel como prova de amor e lealdade”. Era bem-humorada, feliz, fosse como fosse. Ele, muito longe de entender o futuro e as escolhas que viriam, apenas segurava as lágrimas honestas de quem não podia impedir o destino de agir. Ela estava doente. Seria melhor assim… pensava o filho aturdido por uma dor jamais experimentada com o anel na mão.

Quando a saudade apertava, o anel o consolava, e foi desse jeito por muito tempo. Aos olhos do pai, longe dos irmãos que moravam no exterior e perto dos avós maternos, ele ia se construindo em corpo e espírito. Viajou o mundo. Marcou sua pele com aquela experiência. Buscou ares diversos que pudessem arrefecer sua dor. Conheceu a Indonésia, a China, a França, a Itália, a Austrália, o Japão, o Canadá… Espalhou sua coragem de se reinventar por onde esteve. Aprendeu a ganhar dinheiro, a se virar, a entender a essência da nossa existência. Experimentou, de fato, ser humano. A coragem para viver, herdada da mãe, o tornara um homem capaz de amar.

Não bastasse os traços físicos tão atidos aos contos de fada, ele ainda tinha um anel e realmente buscava uma princesa. Sabia cortejar uma mulher. Era muito atraente. Muito envolvente. Um ótimo amante. Um dia, o cupido, cansado de passear por relações mal sucedidas, resolveu flechar a morena mais linda de todos os reinos e entregá-la ao dono do anel.

Conheceram-se como a maioria dos casais… conheceram-se e reconheceram-se no olhar um do outro. Lá no fundo da sua íris azul-esverdeada se formava a imagem mais bela que já projetara em toda a vida. Imediatamente, pensa no anel e suspira. Com a cautela própria do mundo real, guardou-o por muitos anos antes de lhe revelar as intenções. Primeiro, ela precisava saber pronunciar seu nome, conhecer o pai, estudar, amar descompromissadamente. E assim foi. Anna Paula. Anna Paula… repetia ele, degustando as letras e sílabas que lhe arrepiavam o corpo e lhe dominavam o espírito. Feições de modelo, não tardou para a moça também ganhar o mundo. Eram um casal. Desses que brigam porque realmente amam.

Já com seis anos de relacionamento, não tinha perdido o gosto por Anna Paula. Nada abalava sua convicção amorosa. Nem as doses de realidade que, de quando em quando, marcavam os encontros e perturbavam o sentido de ambos. Claro que o ciúme era um problema. Ambos tão divinamente desenhados que nenhum mortal se furtaria a olhá-los.

Naquele dia, brigaram mais uma vez. Nada que afetasse a fé que ele tinha no seu amor. Ficaram algumas semanas sem se falar. Ele ficou sabendo que a sua Anna estaria, linda como sempre, em uma festa numa boate dessas de prestígio social.

Aquele era o momento. Seis anos, uma escolha: Anna Paula, Anna Paula, Anna Paula… Pegou o anel e todo o amor que ele continha para entregá-lo, destemido, à sua Anna. Entrou na boate, receoso, mas convicto de que ela era a pessoa certa. O ambiente parecia lhe dar mostras de sua Anna. Escuro, gente em busca de gente. Barulhento, sem espaço para expressar as emoções.

Viu-a de longe. Cabelos longos, alta, lábios marcados… Estava maravilhosa. Sentiu o coração disparar. Sentiu a sua mãe a seu lado. Dirigiu-se a ela que, arredia pela briga de outrora, pareceu ignorá-lo. Foi incisivo. Não deixaria o momento passar.

– Anna, o anel de minha mãe agora é seu, falou meio abafado pelos sons do ambiente.

-Anna? Eu estou decidido a fazer você feliz.

Ela, que já tinha ouvido sobre o anel, pensou rápido. Segurou-o em suas mãos. Olhou-o demoradamente antes de se decidir sobre aceitá-lo ou não. Ele parecia paralisado. Esperava qualquer reação. Leu nos olhos dela o desamor. Olhou ao seu redor… Viu como estavam afastados e sentiu seu coração gelar. Ela foi tomada pelo súbito prazer que afeta as mulheres que fazem escolhas erradas. Pensou num lampejo de lucidez que poderia se arrepender amargamente (o que deve ter ocorrido). Olhou o anel e o jogou para o alto. Ele rodou reluzente por entre os corações desorganizados que se balançavam em busca de companhia. Deu voltas sem retorno.

Quantas mulheres sonharam em ser Anna… Quantas princesas mereciam aquele anel e aquele príncipe. Mas o coração dele se enganou, deixou se levar pela quase menina que conheceu seis anos antes. Ela estava mudada. Era outra. Era uma mulher (quase má).

De volta ao mundo, ele se reinventou mais uma vez. Não tem mais o anel de sua mãe. Não conseguiu achá-lo em meio à multidão. Mas ainda tem seu valioso coração. E, se o destino for realmente justo, uma princesa de verdade vai encontrá-lo. Anna assistirá, de longe, ao seu maior erro.

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